Autor: Victor Oliveira, especialista em marketing político e comunicação eleitoral e Secretário de Comunicação do PL Araraquara
Nos últimos meses, o Partido Liberal (PL) e o presidente Jair Bolsonaro refletem sobre quem apoiar na disputa pela Prefeitura de São Paulo: o atual prefeito da capital, Ricardo Nunes (MDB) ou o deputado federal Ricardo Salles.
Neste texto, elenco os motivos (e os dados) que me levam a afirmar que a candidatura de Salles é mais competitiva que a de Nunes e traria resultados melhores, tanto para o PL, quanto para Bolsonaro.
A eleição em São Paulo é crucial e muito estratégica para o tabuleiro político de 2026, ano que a direita tem enormes chances de retomar o governo federal, além de eleger uma grande bancada no Senado, mudando a configuração de poder existente atualmente no País.
A análise é dividida em cinco pontos: a dinâmica da eleição paulistana, o descasamento da eleição paulistana e da eleição nacional anterior, a atual conjuntura política em São Paulo, os falsos pontos fracos de Salles e, por fim, a recomendação pela escolha de Salles.
- A DINÂMICA DA ELEIÇÃO PAULISTANA: UMA DISPUTA ENTRE GOVERNO E OPOSIÇÃO
Como já dizia a célebre frase: “o eleitor mora na cidade, e não no estado ou país”. A eleição municipal é pautada pelas questões locais, do cotidiano do eleitor. O atendimento na saúde, a qualidade da escola, a pontualidade do transporte público, a zeladoria da cidade, enfim, são os temas caros ao eleitor para definir seu voto.
Em São Paulo, os dados disponíveis sobre as eleições desde 2000 (ano em que os prefeitos puderam se reeleger pela primeira vez) demonstram que o processo de escolha não é muito diferente: quando o prefeito goza de boa popularidade, consegue a reeleição ou elege o sucessor; do contrário, quando o trabalho do prefeito é reprovado, a oposição vence as eleições.
Os dados da tabela a seguir foram retirados de pesquisas do Instituto Datafolha, entre junho e agosto do ano eleitoral analisado. Elas demonstram a forte correlação entre avaliação positiva e reeleição, assim como avaliação negativa e derrota:
ANO | PREFEITO | % ÓTIMO E BOM | % RUIM E PÉSSIMO | CANDIDATO DO PREFEITO | CANDIDATO VENCEDOR |
2000 | Celso Pitta | 6% | 78% | Paulo Maluf* | Marta Suplicy |
2004 | Marta Suplicy | 28% | 39% | Reeleição | José Serra |
2008 | Gilberto Kassab | 40% | 23% | Reeleição | Gilberto Kassab |
2012 | Gilberto Kassab | 24% | 34% | José Serra | Fernando Haddad |
2016 | Fernando Haddad | 14% | 48% | Reeleição | João Dória |
2020 | Bruno Covas | 25% | 27% | Reeleição | Bruno Covas |
Cabe salientar que, em 2000, embora Maluf e Pitta já tivessem rompido, ambos eram muito identificados, haja vista que Maluf havia sido o principal cabo eleitoral de Pitta na eleição de 1996.
Além disso, a eleição de 2020 foi bastante atípica, ocorrendo 45 dias após o dia previsto e sob a pandemia da Covid-19. Os prefeitos ocupantes no cargo foram bastante beneficiados, com a taxa de reeleição superando os 60% em todo o país. Outro ponto importante sobre 2020 será discutido mais à frente e envolve justamente a escolha de apoio que Bolsonaro fez naquela oportunidade.
Os dados evidenciam que as questões locais se sobrepõem às questões nacionais no pleito municipal. A polarização não se dá entre direita e esquerda, mas sim entre governo e oposição, independente da ideologia. Isso fica ainda mais nítido quando se compara a disputa municipal em São Paulo com a eleição nacional imediatamente anterior.
- O DESCASAMENTO DA ELEIÇÃO PAULISTANA COM A ELEIÇÃO NACIONAL ANTERIOR
Ao longo das últimas disputas municipais em São Paulo, o desempenho na eleição nacional anterior não foi garantia, ou pior ainda, em nada influenciou o quadro no pleito local. O primeiro exemplo se dá em 2002/2004. Na disputa presidencial, Lula (PT) venceu José Serra na capital paulista por 51% a 49% no segundo turno.
Isso poderia ser um sinal de que São Paulo, que havia elegido Marta em 2000 e dado a vitória a Lula em 2002, tinha se virado à esquerda. Eis que veio a eleição de 2004 e uma rejeitada Marta, mesmo com apoio de Lula, foi derrotada por Serra, por 55% a 45% no segundo turno, representando a queda do PT na maior cidade do país.
Já em 2008, a disputa em São Paulo contava com um nome ilustre: o então ex-governador Geraldo Alckmin (PSDB). Na eleição anterior, em 2006, ele havia derrotado Lula (PT) na cidade, por 54% a 46% e aparecia como u dos favoritos na disputa. Entretanto, com Kassab surfando em alta popularidade, Alckmin não conseguiu se viabilizar e ficou fora do segundo turno, que foi disputado entre Kassab e Marta.
A eleição de 2008 mostra bem a dinâmica governo/oposição se sobrepondo às questões nacionais. Mesmo Alckmin sendo um nome conhecido e com bom recall, não encontrou espaço no eleitorado, que se dividiu majoritariamente entre Kassab (governo) e Marta (oposição). Além disso, a força de Lula em São Paulo, com recorde de popularidade naquele ano, não foi capaz de superar a aprovação de Kassab, que derrotou Marta por 60% a 40% no segundo turno.
Em 2012, a situação de Kassab se inverteu e o prefeito deixava a administração paulistana amargando uma alta rejeição. Na disputa municipal daquele ano, o candidato do grupo de Kassab foi o experiente José Serra, ex-governador e ex-prefeito, que havia derrotado Dilma em 2010, na disputa pela Presidência, na cidade de São Paulo, por 54% a 46%. Porém, o rechaço a Kassab era tanto, que o neófito em eleições Fernando Haddad (PT) foi eleito.
Já em 2020, uma outra situação semelhante foi apresentada: Marcio França, ex-governador, que havia vencido João Dória por 58% a 42% na capital paulista em 2018, apresentou-se para a disputa, tendo seu recall como grande trunfo. França acabou fora do segundo turno, disputado entre Covas e Guilherme Boulos (PSOL).
As eleições de 2012 e 2016, no entanto, mostram que o apoio de padrinhos “nacionais” é importante para dar um impulso inicial às candidaturas de desconhecidos do eleitor. Em 2012, Lula foi o padrinho de Haddad, já em 2016, Alckmin apresentou Dória aos paulistanos. Outro tópico a ser debatido mais à frente.
Sendo assim, o fato de Lula ter derrotado Bolosnaro em 2022 na cidade não significa que a esquerda vai vencer a eleição em 2024. Os dados histórico demonstram a importância da conjuntura local, principalmente da aprovação do prefeito, em detrimento ao cenário nacional na disputa pela Prefeitura de São Paulo. E os dados atuais não são nada favoráveis ao prefeito Ricardo Nunes, indicando sérias dificuldades pela frente.
- A ATUAL CONJUNTURA POLÍTICA NA CIDADE DE SÃO PAULO
Ricardo Nunes (MDB) assumiu a Prefeitura no início de 2021, logo após o falecimento de Bruno Covas (PSDB), por efeito de um câncer. Em setembro de 2023, o Datafolha realizou pesquisa, apontando que a gestão dele era regular para a maioria dos paulistas (49%), já para 23% é ótima/boa e para 24% é ruim/péssima. Na pesquisa estimulada de intenção de votos, Nunes aparece com 24%, oito pontos atrás do atual líder da corrida, Guilherme Boulos (PSOL).
À primeira vista, pode parecer que o problema de Nunes é o desconhecimento do eleitorado pelo seu nome e que há um grande espaço para crescer, com as ações na reta final da gestão e a campanha eleitoral. Porém, ao analisar dados mais profundos da pesquisa, fica claro que o prefeito pode estar próximo do seu teto.
Quando perguntados sobre grau de conhecimento, 24% dizem conhecer bem Nunes, enquanto 26% dizem conhecer um pouco. A soma (50%) é quase igual a de Boulos (53%). Outro ponto em comum é que 21% não conhecem Nunes e 20% não conhecem Boulos. Ou seja, pode-se dizer que o prefeito é tão conhecido quanto o candidato líder das pesquisas.
Para 22% dos entrevistados, o principal problema de São Paulo hoje é a segurança pública, com aumento da violência e criminalidade. Já para 16%, a Saúde é o maior problema da cidade. Saúde e Segurança Pública são duas áreas de difícil melhoria a curto prazo, demandando grandes investimentos e ações estruturadas.
Para conseguir sensibilizar o eleitor a aprovar sua gestão e confiar o voto na sura reeleição, Nunes precisaria de uma melhora sensível nessas duas áreas, algo que não parece viável no horizonte. Outros pontos que também costumam influenciar bastante a decisão do eleitor são mal avaliados pela população. Para 49%, a conservação do asfalto das ruas da cidade é ruim/péssima e para 67% o trânsito da cidade é ruim/péssimo.
Além disso, Nunes acumula o desgaste de oito anos de gestão do grupo político ao qual pertence, com início em 2017, primeiro ano de João Dória (PSDB), depois passando por Bruno Covas e, por fim, Nunes. A conexão entre Nunes e Dória, que é um ex-prefeito bastante rejeitado em São Paulo, será bastante explorada na campanha eleitoral.
Outro dado fundamental, questionado pelo Datafolha, é se o eleitor prefere que a maior parte das ações do próximo prefeito de São Paulo sejam, de um modo geral, iguais às ações do atual prefeito ou que a maior parte dessas ações sejam diferentes das do atual prefeito. Nada menos que 79% responderam que querem ações diferentes.
As pesquisas de intenção de voto apontam que o sentimento na cidade é oposicionista. No Datafolha, que não incluiu o nome de Salles, a sondagem mostra 43% de votos em candidatos oposicionistas (Boulos e Tabata Amaral) e outros 10% distribuídos entre candidatos de “centro” (Kim Kataguiri e Vinicius Poit).
A liderança de Boulos é um retrato do sentimento oposicionista. O atual deputado federal do PSOL possui recall eleitoral, tendo em vista ter ficado em segundo lugar na disputa de 2020 e é identificado como a “mudança”, dado que já enfrentou o grupo político do atual prefeito na urna. No entanto, Boulos tem muitos flancos a serem explorados, principalmente a ligação com movimentos responsáveis por invasões de propriedade, alinhamento a governos comunistas/socialistas e a imagem de radical, que colocaria em risco a segurança jurídica na capital paulista.
Nesse contexto, uma candidatura oposicionista a Nunes, liderada pelo ex-ministro Ricardo Salles, com apoio de Bolsonaro e tendo um programa de centro-direita aplicado à gestão municipal tem grande potencial de sucesso, mesmo que setores da imprensa e algumas figuras de proa da política digam o contrário.
- OS FALSOS PONTOS FRACOS DE SALLES
Bastou Salles colocar sua pré-candidatura à Prefeitura de São Paulo para que múltiplos atores passassem a enxergar “pontos fracos”, que poderiam aniquilar as chances do deputado na disputa. Mas, ao olhar mais atentamente para o quadro político, a situação é bem diferente.
O primeiro ponto apresentado é que Salles é “bolsonarista demais”, possuindo grande identificação com Bolsonaro, de quem foi Ministro do Meio Ambiente. Para quem argumenta desta forma, só teria chance na disputa um nome não tão ligado a Bolsonaro e que tivesse o apoio “velado” do ex-presidente, justamente o que deseja Nunes.
Como justificativa, mencionam a derrota de Bolsonaro para Lula na capital paulista em 2022 (um sinal de que a cidade estaria pendendo para a esquerda) além de pesquisas que apontam alta rejeição para o candidato de Bolsonaro na disputa municipal paulistana.
O primeiro argumento já foi extensamente debatido nos dois primeiros tópicos deste artigo, nos quais procurei demonstrar a ausência de correlação entre a eleição nacional e a municipal. Já o segundo ponto foi desmentido pela própria realidade. O apoio de Bolsonaro foi fundamental para eleger inúmeros candidatos. O principal deles o atual governador de São Paulo, Tarcísio de Freitas, completamente neófito em eleições e que venceu PT e PSDB em 2022, mesmo com pesquisas indicando uma rejeição superior a 60% ao candidato de Bolsonaro no estado.
Se a avaliação realmente for de que a cidade de São Paulo virou um reduto esquerdista, nem adiante disputar a eleição. O melhor seria retirar totalmente Bolsonaro da disputa e aguardar o pleito municipal de 2028.
Salles não esconde de ninguém que conta com apoio de Bolsonaro e está correto. Além de defender o capital político do ex-presidente, também se associa automaticamente a bandeiras da direita, principalmente na área de Segurança Pública, apontado como o maior problema da capital paulista atualmente. Enquanto Boulos e Nunes titubeiam no assunto, Salles defende a abordagem “lei e ordem”, se espelhando na política de tolerância zero, implementada pelo prefeito Rodolph Giuliani em Nova York.
Ao não ter medo de se assumir bolsonarista, Salles encara o debate de peito aberto, defendendo propostas e ideias que dialogam com o sentimento majoritário do eleitor paulistano, ávido por mudança na gestão municipal. Um candidato “menos bolsonarista” teria dificuldade em romper com a covardia demonstrada por Nunes e Boulos ao debater tais assuntos.
Outro quesito mencionado é a gestão de Salles à frente do Ministério do Meio Ambiente. É difícil acreditar que a esquerda irá utilizar essa suposta “arma” quando o mês de novembro de 2023, já na gestão Lula/Marina Silva, o Pantanal registrou recorde de queimadas e o céu de Manaus ficou encoberto pela fumaça dos incêndios.
A suposta preocupação da esquerda com a pauta ambiental virou deboche, com o silêncio obsequioso de personalidades e intelectuais em relação à pífia política ambiental do governo Lula, comandada por Marina Silva. Debater essa pauta com Salles seria um tiro no pé, que dificilmente a esquerda daria.
Além disso, Salles ainda não disputou cargos majoritários e seria uma novidade para o eleitor paulistano, que costuma abraçar candidatos novatos (como foram os casos de Dória e Haddad), em contraponto a “políticos profissionais”. Não possui condenação judicial, nem foi acusado de praticar corrupção. Ele também demonstrou ter habilidade política e discursiva, seja no Ministério, na Jovem Pan ou no mandato de deputado federal.
- POR QUE APOIAR SALLES?
Após observar os quatro primeiros tópicos, fica claro que o melhor caminho para o PL e para Bolsonaro seria o lançamento da candidatura de Salles. Ele reúne as condições necessárias para crescer, passar ao segundo turno e vencer a eleição.
Salles seria uma candidatura de oposição, em uma eleição com forte desejo de mudança, com propostas concretas e que dialogam com as principais preocupações do eleitorado paulistano, é um nome novo e que não tem medo de aparecer ao lado de Bolsonaro.
No início do texto, relembrei a tipicidade da eleição de 2020, incluindo um fator que colaborou para o desenrolar daquele pleito: a escolha de apoio feita por Bolsonaro. Na época, o presidente estava sem partido e não tinha um candidato seu. Apoiou, de forma tímida, o deputado federal Celso Russomanno (Republicanos), um nome já conhecido, desgastado por duas derrotas seguidas nas disputas anteriores. O resultado: Russomanno amargou o quarto lugar e a mídia debitou o desempenho na conta de Bolsonaro.
Situação semelhante pode acontecer agora, caso Bolsonaro dê um apoio “tímido” para Nunes. A candidatura do prefeito, embora conte com o peso da máquina e o apoio de diversos partidos, enfrenta graves problemas para decolar, em função da insatisfação popular com a gestão e o amplo desejo de mudança na cidade. Ao apoiar Salles, Bolsonaro daria o impulso inicial a uma candidatura viável, algo que já foi detectado em levantamento do Paraná Pesquisas de maio/23, que mostrou as intenções de voto em Salles subirem de 11% para 20%, quando seu nome é associado ao de Bolsonaro.
O eventual apoio de Bolsonaro a Nunes, nessas condições, teria grandes chances de ter dois efeitos: facilitar a vida de Boulos, tornando a eleição plebiscitária entre um prefeito impopular um candidato oposicionista com recall; além disso, desperdiçar o capital político na maior cidade do país, impedindo a formação e crescimento de uma nova liderança política.
Por outro lado, o lançamento de Salles pelo PL com apoio de Bolsonaro faria com que a legenda 22 se mantivesse em evidência na maior cidade do país (como Nunes é do MDB, a legenda em evidência seria o 15), contando com uma candidatura com reais possibilidades de vitória e com alta chance de ampliação da bancada de vereadores na Câmara Municipal. O aumento de capilaridade local é fundamental para o PL ampliar as bancadas de deputados nas eleições de 2026.
As cartas estão colocadas na mesa. O futuro político do país passa pela eleição em São Paulo. Um erro de escolha pode representar o pior cenário possível: uma vitória de Boulos. A participação de Bolsonaro nesta eleição é fundamental para evitar esse cenário, desde que ele ofereça seu capital político a uma candidatura que tenha condições de vencer. E essa candidatura, por tudo que já foi exposto, é de Ricardo Salles.
Fontes:
https://www1.folha.uol.com.br/fsp/cotidian/ff2007200019.htm
https://www1.folha.uol.com.br/folha/brasil/ult96u61096.shtml
https://media.folha.uol.com.br/datafolha/2023/09/04/Inv23o2novvotoCompleta2290SP.pdf